Eu sou feliz por ser casado. Eu e minha querida esposa temos várias discussões filosófico-político-religiosas, geralmente dentro do carro, nos nossos trajetos diários. Quando conversamos sobre o ensino nas faculdades da nossa República Federativa, tendemos a sempre comparar os cursos universitários que fizemos, ambos da Universidade Federal de Pernambuco. Ela estudou Comunicação (Publicidade e Propaganda) e eu, Direito. Existem algumas diferenças interessantes entre o escopo filosófico dos dois cursos, que são quase completamente antagônicos.
A Faculdade de Direito do Recife, para quem não conhece, é o nome do Centro de Ciências Jurídicas da UFPE. É a única faculdade, exceto as que estão no interior do estado, obviamente, que está separada do campus da Universidade, ficando localizada no centro da cidade. Por ser um curso extremamente tradicional, criado por decreto imperial em 1827 (daí o tal dia do advogado, ou dia do pendura), o dia-a-dia da faculdade é cheio de detalhes interessantes, como a atuação sempre muito ativa do movimento estudantil e do Diretório Acadêmico, e o fato de os estudantes não interagirem quase nunca com os outros centros da UFPE.
O Centro de Artes e Comunicação (onde minha amada estudou) fica bem no meio do campus, e congrega estudantes de diversos cursos de graduação, incluindo artes plásticas, design, artes cênicas, expressão gráfica, letras, arquitetura e urbanismo, comunicação, cinema, e mais alguns. A efusão cultural é muito forte. O próprio prédio foi concebido para funcionar como uma galeria de arte, com amplos espaços vazios, onde são feitas exposições periodicamente, e salas abertas na parte de cima, e que podem ser vistas por quem passa nos corredores superiores.
O ponto onde eu queria chegar, entretanto, é o do ensino. Na FDR, boa parte dos professores é composta por servidores públicos das mais altas esferas do Poder Judiciário e do Ministério Público: juízes, promotores, procuradores da república. Temos ainda procuradores federais, advogados da união, procuradores da fazenda nacional, advogados e alguns (poucos) que se dedicam exclusivamente à academia. Esse fato, aliado ao constante processo de "mumificação" de (frizo) alguns dos docentes, nos leva a certas distorções. Falo de professores que não buscam se atualizar em termos de conteúdo das disciplinas, e continuam trabalhando conceitos superados, ideias atrasadas, ou até - pasmem! - diplomas legais revogados. Eu não estou brincando, um professor não pode falar a mesma coisa em diversas turmas ao longo de 15, 20 anos, isso é loucura! O pensamento humano evolui, e nós precisamos evoluir junto, especialmente para podermos acompanhar o mercado.
Sim, o nosso não tão querido mercado! Quem me conhece sabe o quanto sou avesso a essa da existência de um ente supraespiritual capaz de regular todas as relações econômicas, promovendo o bem-estar humano como um esquisito resultado da busca por interesses pessoais. Entretanto, não podemos negar que o tal mercado existe, e geralmente não é nosso amigo. Precisamos nos preparar para enfrentá-lo. Não falo apenas do mercado profissional, em que várias pessoas concorrem a uma vaga de emprego em algum lugar. Aqueles nobres espíritos que querem seguir o difícil caminho da academia também se submetem a um mercado, e existem critérios que vão determinar se serão agraciados ou não com certas oportunidades.
O jurista que passa hoje pela FDR só aprende a se preparar para o mercado nos estágios em escritórios de advocacia e cursinhos para concurso público. Isso é fato. Há quem diga que "esse negócio de preparar profissional pro mercado é coisa de curso técnico. Universidade é pesquisa". Tenho pena. Não me interpretem mal, curso técnico e graduação não podem ser a mesma coisa, mas a pesquisa, que é fundamental, precisa estar alinhada com o que o mercado oferece, ou não servirá para muita coisa. Vocês não acham meio cansativo? Várias pessoas escrevendo várias coisas que ninguém nunca mais vai ler? Essas são as nossas monografias.
O CAC tem seus problemas, múmias, criaturas quem transmitem mensagens incompreensíveis, os cursos não são tão tradicionais, e ainda estão engatinhando em termos de arcabouço filosófico. A maior parte desses cursos é nova, e eles ainda estão começando a discutir se existe ou não uma ciência da comunicação ou das artes, e que tipo de abordagem as universidades devem adotar para estudá-las. Uma coisa, porém, é fato. Os estudantes, ao menos, tem consciência da falta de uma abordagem prática em certas disciplinas. Eles se preocupam com o tal mercado.